Aleksandr Sokurov, assim se chama o responsável pela minha
insônia de hoje, acordei no meio da madrugada e não voltei a dormir, em meio a
vários pensamentos desconexos e ou antecipatórios de situações/projeções futuras,
o filme PAI E FILHO (2003) se tornava quase onipresente. Eu vi o filme na tarde
anterior a essa madrugada insone. Confesso que o entendimento do filme ficou
longe de uma satisfação plena, mas ele pareceu sinestésico para mim, com todo o clima
onírico e desejoso que a relação entre um jovem pai e um filho já iniciando a
idade adulta poderia passar- isso em uma situação (semi)ideal. Além de ser magnificamente
interpretado e dirigido com uma pegada teatral e sob uma rígida e sentimental
trilha sonora, o filme parecia entrar no passado e estar sempre num embate em
que, salvo uma situação, a autoridade paterna não era o alvo crítico nem muito
menos levada em conta na dramatização da narrativa. Tentei ler o filme como
uma representação subjetiva de um ideal romântico na busca interior pela
aceitação daquilo que você projeta como um desejo irreconciliável com aquilo
que você quer e aquilo que você pode ser/ter.
Contudo, PAI E FILHO é um filme russo e não por acaso os dois
personagens são militares, de modo que não podemos perder de vista contexto
cultural e histórico ao qual ele foi criado. Pode ser que entender os dois personagens
como metáforas ou mesmo como uma alegoria de uma nação que passou/passa por uma situação político-econômica extremada possa soar forçado, mas bem que poderíamos ensaiar. O pai poderia ser a
representação da antiga união soviética robusta e iluminada como um forte sol
em meio à neve, mas que se mostra incapaz. O personagem paterno sofre não só
por ciúme inconfesso de seu filho manter relações que vão além dele mesmo, como
também por um ferimento agudo no pulmão, sua caixa torácica, ou seja, sua
fragilidade é o tempo todo escancarada pelo filho, essa nova Rússia, não mais
socialista, mas que revela ser o desejo inconfesso de uma antiga nação que chafurdou
numa tentativa inglória de estabelecimento de uma nova ordem socioeconômica. Tal
filho mantêm relações de poder com o pai e sobre aqueles com que se relaciona,
sempre se colocando no centro por onde tais relações se estabelecem. No inicio
o filho está no colo do pai e este afirmando que o salvou logo depois o filho
está sozinho em um caminho, sim a nova nação seguirá por um novo caminho, a
antiga ficará no passado como uma sombra fria que poderia ser e que não foi, e o
máximo que poderia ter feito foi parir essa nova Rússia, foi salvar esse filho
que herdará apenas as armas de um exército sangrento.
Mas pode ser que nada disso seja, e eu não sei como será o
meu dia depois de só 4 horas dormidas...
J .
Um comentário:
Tua interpretação quase redime a minha incompreensão do filme. Mas, como eu e tu concordamos nesta área, tem que se estudar um pouquinho de História Russa para engolir com gosto esta jóia que, por enquanto, me pareceu indigesta e afetada. Mas obrigo-me a revê-lo. Mesmo sem ter gostado muito dele, o achei lindo, com uma trilha sonora, de fato, arrebatadora e uma fotografia suprema, que torna ainda mais belos aqueles dois maravilhosos pedaços de homem! (WPC>)
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